Entre a Gratidão e a Autonomia: o rompimento que expõe os desafios da política em Parnaíba

Deputada Gracinha Mão Santa
📷Gracinha Mão Santa © Reprodução
🏠Parnaíba (PI)

Nota oficial da deputada Gracinha Mão Santa cobra lealdade do prefeito Francisco Emanuel, mas episódio reacende o debate sobre os deveres de um gestor público, que precisa de autonomia e independência para governar.

O recente rompimento político entre o prefeito de Parnaíba, Francisco Emanuel Cunha de Brito, e a deputada estadual Gracinha Mão Santa escancarou um dos dilemas mais antigos da política: até onde vai a gratidão e onde começa o dever de um gestor público de governar com autonomia? A nota oficial divulgada por Gracinha nesta terça-feira (25) trouxe à tona mágoas, ressentimentos e, principalmente, a cobrança de uma lealdade pessoal que, segundo ela, teria sido ignorada.


Na nota intitulada "Francisco e a Ingratidão: da Confiança ao Esquecimento", Gracinha relembra que foi a família Mão Santa quem deu a Francisco as primeiras oportunidades na vida pública, levando-o de estagiário a prefeito da segunda maior cidade do Piauí. “Foi nesse contexto que ele passou de um estagiário a uma figura-chave”, ressalta a deputada, demonstrando o peso da aposta feita pela família em sua trajetória. No texto, ela ainda destaca que esperava “lealdade, reconhecimento e respeito à história que permitiu sua ascensão”, mas o que se viu foi um "movimento que deixou de lado aqueles que lhe abriram as portas".

O desabafo da deputada evidencia um sentimento legítimo de quem construiu um grupo político forte em Parnaíba. Mas, o episódio também levanta uma discussão importante sobre o papel de um gestor público eleito. Uma vez no cargo, o prefeito passa a ter como principal obrigação administrar o município de forma independente, colocando o interesse coletivo acima de laços pessoais ou compromissos de campanha.

Tempo da Política:

O conceito de "tempo da política", como definido por autores como Palmeiras (1997) e Heredia (2010), representa o momento em que os embates eleitorais e disputas partidárias dão lugar à governança, quando os palanques são desmontados e a prioridade se volta para o atendimento das demandas da população. Durante muito tempo, essa lógica prevaleceu: passado o calor das eleições, era hora de trabalhar, construir e administrar. No entanto, esse paradigma vem se desfazendo nos últimos anos, à medida que vivemos um cenário de polarização crescente e um "tempo da política" que se estende para além das campanhas, invadindo o cotidiano da população e da gestão pública.

Nesse novo cenário, a expectativa de que um prefeito siga fielmente a cartilha de quem o ajudou a chegar ao poder já não encontra mais tanto espaço na prática democrática. Afinal, governar é, acima de tudo, ter a coragem de tomar decisões - muitas delas difíceis e impopulares - para garantir o bom funcionamento da máquina pública e o bem-estar coletivo. E, para isso, a autonomia do gestor não é apenas desejável, é essencial. Sem ela, a política deixa de ser instrumento de transformação para se tornar refém de interesses pessoais e palanques que nunca se desmontam.

O tom da nota também revela como a política local segue presa ao velho paradigma da gratidão eterna, como se o gestor eleito devesse satisfações pessoais a seus padrinhos políticos. No entanto, a Constituição e o compromisso com o voto popular determinam que o dever maior de quem ocupa um cargo executivo é com o município, e não com um grupo político específico.

Parnaíba, mais uma vez, se vê no centro de uma disputa que mistura mágoas pessoais e interesses administrativos. Enquanto isso, a população observa e espera que, acima de tudo, o prefeito lembre que a cidade precisa ser governada - com ou sem gratidão, mas com responsabilidade e respeito à sua autonomia como gestor.

No fim das contas, como bem disse a deputada, “a história ainda está sendo escrita”. Cabe agora ao prefeito Francisco Emanuel decidir se governará olhando para o passado ou se, rompendo amarras, conduzirá Parnaíba rumo ao futuro.

Por Walter Fontenele | Portalphb

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