As Bikes da Discórdia: Uma Crônica de Gente como a Gente

Imagem Ilustrativa
📷Imagem Ilustrativa © Reprodução
🏠Parnaíba (PI)

Era uma vez, numa Parnaíba quente e cheia de presepeiros políticos, um candidato a vereador que teve uma ideia daquelas que parecem brilhantes no calor do momento: conquistar o povo com bicicletas velhas. Não era só doar e pronto, claro que não. O plano era maquiavélico: entregou as magrelas surradas a um comerciante, um dono de padaria com coração grande, e pediu que ele desse um jeito nelas - uma “guaribada”, como se diz por aí - para depois sorteá-las entre os seus clientes mais fiéis. E, óbvio, o crédito todo ia para o candidato, o grande benfeitor, o salvador das pedaladas.

O comerciante, homem simples e trabalhador, abraçou a missão. Pegou as bikes, que mais pareciam ter saído de um museu de sucata, e meteu a mão na massa: pintou com capricho, trocou guidão, ajeitou freios e até deu uma lubrificada para disfarçar o barulho. Quando terminou, as bicicletas estavam lá, quase brilhando no canto da padaria, um sonho para qualquer um que passasse. A molecada do Conjunto já fazia planos, imaginando as piruetas pelas ruas, o vento batendo no rosto, enquanto os pais enchiam o carrinho de mercadorias para garantir mais chances no sorteio. Era um clima de festa, de esperança miúda, mas sincera.


Tudo parecia perfeito. As bikes viraram o assunto do Bairro, o comerciante sorria vendo o movimento crescer - afinal, quanto mais mercadoria comprada, mais cupons pro sorteio –, e o candidato? Esse já se imaginava na Câmara, com placa na porta e o povo agradecendo sua “generosidade” em verso e prosa. Mas aí veio o dia da eleição, e o destino, há o destino, esse danado que adora pregar uma peça, resolveu dar uma rasteira. As urnas abriram a boca e cuspiram um resultado que ninguém no QG do candidato queria ouvir: derrota feia, “fumo” dos grandes, daqueles que deixam o ego em frangalhos.

Perder faz parte do jogo, todo mundo sabe. Tem mais candidatos voltando para casa de mãos abanando do que subindo no palanque da vitória. Mas o nosso nobre aspirante a vereador não engoliu o tombo com dignidade. Nada disso. Ele olhou para o Conjunto, pro comerciante, para as bikes e pensou: “Se não me quiseram, não vão ficar com o meu presente”. Guardou uma mágoa danada, como se o padeiro e os moradores tivessem pessoalmente riscado o nome dele das urnas. E então, num belo dia, mandou um apoiador – desses que batem no peito para defender o chefe em troca de um tapinha nas costas – bater na porta da padaria com uma ordem seca: “As bikes voltam comigo. O candidato disse que foi traído por essa gente”.

O comerciante, coitado, ficou sem chão. Não era de briga, nem de peitar os outros. Só entregou as bicicletas, uma por uma, vendo o trabalho dele ser amontoado no porta-malas apertado do carro do tal apoiador. Do outro lado da rua, a molecada assistia tudo, revoltada. Teve grito, teve choro, teve até menino mais atrevido mandando um “Volta daqui a quatro anos, seu carniça.”, na esperança de que o candidato ouvisse, mas o candidato não estava lá, mandou representante. As bikes, que eram promessa de alegria, viraram só uma lembrança amarga, um “quase” que ninguém esquece.

E assim, Parnaíba ganhou mais uma história para contar nas rodas de conversa, daquelas que parecem inventadas, mas são puro suco da vida real. Um candidato, um comerciante de boa fé, uma molecada sonhadora e um punhado de bikes que pedalaram direto pro fundo da memória de um Conjunto tão vivo quanto esquecido. É o tipo de coisa que faz a gente rir para não chorar – ou chorar enquanto ri, vai saber.

Por Walter Fontenele | Portalphb

Tecnologia do Blogger.