Não pode haver censura nas redes sociais

Moraes e Musk
📷Moraes x Musk © Reprodução
🏠Brasil

A primeira imagem me veio logo: Musk deixou a bola pingando na pequena área. Xandão, centroavante rompedor, encheu o pé. Muito possivelmente estava impedido, mas, como ninguém pediu o VAR, o gol valeu. Mesmo porque o VAR, no caso, seria o próprio Xandão, quer dizer, o ministro Alexandre de Moraes. Não apenas o gol valeu, como o VAR deu falta cometida por Musk, cartão amarelo, com ameaça de vermelho.


Logo, o centroavante/VAR levou a melhor e conseguiu apoio de seu time. Entusiasmado, mandou ver:

- Tenho absoluta convicção de que o Supremo Tribunal Federal, a população brasileira e as pessoas de bem sabem que liberdade de expressão não é liberdade de agressão.

Filósofos, juristas, pensadores e jornalistas - para ficar só no grupo que nos interessa no momento - têm o dever do ceticismo. De levantar a dúvida razoável. De checar e revirar um tema de todos os lados. “Absoluta convicção” não cai bem. É difícil para qualquer pessoa de princípios políticos e morais ter “absoluta convicção”de qualquer coisa.

Dirão: mas o ministro escolheu um bom ponto. Difícil discordar da sentença “liberdade de expressão não é liberdade de agressão”. E por que é difícil? Porque é tremenda obviedade. Usando recurso clássico de oratória, a repetição do óbvio, o ministro seguiu: “Liberdade de expressão não é liberdade para a proliferação do ódio, do racismo, da misoginia, da homofobia… de defesa da tirania”.

Está na cara, não é?. Posso até ameaçar alguém no auge de uma discussão — “vou te pegar na saída”—, mas não posso atirar no meu inimigo. Claro, não precisam me dizer: se ameaço alguém e ponho um capanga armado seguindo o cara, a coisa mudou de figura. Musk ameaçou não cumprir decisões da Justiça brasileira. O que é diferente de não cumprir. Mas o ministro partiu para a briga, ameaçou de volta - e não é o que se espera da Corte Suprema.


Convém, portanto, bagunçar o óbvio. Liberdade de expressão: há doutrinas diferentes que abrem ou restringem esse direito individual. Nos Estados Unidos, a liberdade de discurso é mais ampla do que se entende no Brasil. Lá, você fala o que quiser, publica o que quiser. Quem se sentir ofendido ou ameaçado vai aos tribunais, onde se discutirá, de um lado, se foi dada uma informação, a simples expressão de uma opinião, um ponto de vista, ou, de outro, uma ofensa pessoal (calúnia, injúria, difamação) ou ameaça à segurança nacional.

Aqui no Brasil, estamos diante de uma questão grave: o andamento do megainquérito das fake news, conduzido por Moraes, que agora inclui Musk. Sem falar no longo prazo do segredo de Justiça imposto a diversos pontos do processo, há uma tendência de tentar barrar as fake news (mais a agressão, o ódio etc.) antes que o discurso seja dito, publicado na imprensa tradicional ou nas redes. Prevalecendo essa tendência e essa prática, lógico que haverá censura.

E aqui estamos prontos para tumultuar tudo: o que é fake news? Se nullum crimen nulla poena sine previa lege, ninguém pode ser acusado ou condenado por divulgar fake news porque a lei brasileira não diz o que é isso. Pois é, o projeto está na Câmara. Estava parado, agora está no tumulto.

Tem mais: se for definido o que é fake news, o que está longe de ser simples, caímos em mais duas questões. Primeiro, quem fará a lista das fake news? Segundo, quem será o censor encarregado de identificá-las e barrá-las antes da divulgação? Um jornal, uma emissora de televisão ou uma rádio terão de censurar seus jornalistas? As redes sociais terão de criar algoritmos para capturar e tirar do ar as fake news e discursos considerados - por que autoridade? - de ódio, etc.?

Tudo considerado, é preciso fazer a lei e regulamentar a mídia digital. Concluo com José Paulo Cavalcanti Filho: “Não pode ter censura. O mais, é o Código Penal. Simples assim”.

Por Carlos Alberto Sardenberg

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