Cultura: Os chineses de Dom Pedro II e o projeto para substituir os negros
Durante o reinado de Dom Pedro, um grupo de congressistas e fazendeiros quis convencer o imperador a promover um grande projeto de “importação de chineses para o Brasil. Conheça um pouco mais dessa história.
Não há praticamente uma única cidade brasileira em que não possa ser encontrado um chinês, ou trabalhando em bares e restaurantes, ou exercendo outras atividades ligadas ao comércio e indústria. Mas por bem pouco a presença desse povo não foi muito maior em nosso território e cultura.
Com os sinais de declínio da escravidão no Brasil a partir de 1850 com a Lei Eusébio de Queiróz que proibia o tráfico negreiro e a Lei do Ventre Livre de 1871, que estabelecia que filhos de escravos seriam livres, o Brasil tentou criar meios de substituir a mão de obra dos negros pela dos chineses.
Com medo de que as lavouras de café entrassem em colapso sem a presença escrava, alguns fazendeiros quiseram substituir a mão de obra negra por “semiescravos” ou “chins”. E procuraram o Primeiro-Ministro brasileiro João Lins Vieira Cansanção de Sinimbu, o Visconde de Sinimbu, para tratar da questão com o congresso e com o imperador Dom Pedro II, que se mostrou entusiasta da ideia. Em 1897, em discurso para o Senado, onde buscava a liberação de recursos para “importar os chins”, Sinumbu argumentou:
“O trabalhador chim, além de ter força muscular, é sóbrio, laborioso, paciente, cuidadoso e inteligente mesmo. Por sua frugalidade e hábitos de poupança é o trabalhador que pode exigir menor salário. Assim, deixa maior soma de lucros àquele que o tem a seu serviço. É essa precisamente uma das razões por que devemos deseja-lo para o nosso país”.
Aliados do imperador queriam exploração de mão de obra chinesa e futuro projeto de “embranquecimento” de raça
O plano brasileiro era de exploração da mão de obra chinesa nos mesmos moldes que outros países já estavam fazendo, em especial os Estados Unidos – empregando os chineses na expansão da malha ferroviária -, Cuba e o Peru, em que a prática corrente era de remuneração irrisória, castigo físico, alocação em ambientes insalubres e controle de movimentação pelo território, em suma, um regime de semiescravidão e de vida controlada. E, enquanto o Brasil sobrevivia exportando café, a China tinha no trabalhador chinês um produto para negociar. O Brasil da época tinha 10 milhões de habitantes contra 370 milhões da China.
A ideia que ganhou força e mobilizou o Império e seus aliados não foi bem recebida por alguns; comerciantes, políticos e alguns empresários do incipiente capitalismo brasileiro mobilizaram-se em uma campanha contra a vinda dos estrangeiros, e não porque seriam explorados e escravizados, mas por serem chineses e não italianos. No Senado alguns discursos – conforme os arquivos históricos da casa de leis – foram extremamente racistas e xenofóbicos.
Um dos congressistas, o Senador Dantas (AL), deu o tom da campanha contra os asiáticos:
“Senhores, não sei que fatalidade persegue este Império, digno de melhor sorte: ou há ter africanos, ou há de ter chins? Li numa memória acerca da colonização chim que diz ser essa uma raça porca que muda de roupa só duas vezes ao ano. Pois, quando as nossas leis estabelecem prêmios àqueles que trouxerem para o Império boas raças de animais, tratam de mandar buscar rabichos e caricaturas de humanidade”.
Imprensa brasileira publicou charges em campanha contra a presença de chineses. Congresso mobilizou aliados de Dom Pedro para “importar” asiáticos |
Em 1878 o governo brasileiro organizou o Congresso Agrícola, em que discutiu abertamente os rumos da produção agrícola brasileira, em especial da cafeicultura, e o projeto de estabelecimento de um programa de substituição dos escravos por uma “raça de trabalhadores europeus que pudessem embranquecer a população brasileira”.
Trabalhador chinês em trabalho agrícola |
Em 1881 a diplomacia brasileira consegue estabelecer acordos com os seus pares chineses para o livre trânsito e instalação dos trabalhadores asiáticos no Brasil, mas em 1882 Dom Pedro II frustra os planos dos fazendeiros e políticos que aguardavam pelos chineses ao sinalizar que não arcaria com os custos da “importação” dos asiáticos. O imperador, que inicialmente apoiava a ideia, agora repassava aos seus aliados os custos da execução, enterrando a proposta.
Por outras condições, décadas após, o Brasil seria a escolha de milhares de trabalhadores, não apenas dos chineses – tão desprezados e humilhados anteriormente -, quanto dos disputados europeus.
Por Arquivo histórico do Senado Federal
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